29 de fev. de 2008

Tipinho

Nos idos de 1998 tinha uma menininha que circulava pelas empresas da rua 18 do Forte, na região que eu trabalhava, vendendo algumas tranqueiras (não lembro se eram livrinhos evangélicos ou outra coisa, mas enfim...) o mesmo ofício dos vendedores de pastel ambulantes. Tinha cerca de 11 anos, magrinha, elétrica, morena e com uma cachopinha de cabelos "pichaim".
Sua técnica de vendas era engraçada: ela tinha um texto decorado que descarregava assim que entrava em algum estabelecimento. Ela entrava, e se via pessoas (podiam ser recepcionistas, visitantes, ou nem que fosse o gabinete do prefeito) ela desatava aquela ladainha como um robô acelerado: olá, eu sou Fulana, esses são livros ótimos que irão lhe trazer as mais belas histórias, etc, etc, tudo naquele linguajar obviamente decorado, provavelmente por imposição, que soava completamente artificial, coisa que ela mesma notava, pois não usava muito do recurso de olhar nos olhos seus interlocutoras e ainda por cima nitidamente ria da situação. Apenas cumpria sua função.
A última vez que vi ela, acredito que tenha sido o fim de sua vertiginosa carreira: um repórter, na TV falava sobre a exploração do trabalho infantil, e lá estava ela: sentada num banco escorado numa parede, com aquela cara de quem foi apanhado cometendo alguma infração (na real, deviam apanhar quem pôs ela aí). Ela até deu um depoimento. Depois nunca mais vi.

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